Entre os fatores que caracterizaram os inícios do Nacional-socialismo, cumpre ressaltar o papel relevante desempenhado pela ascensão espetacular e pela veneração quase religiosa do Führer. A estrutura organizacional e as atividades do movimento basearam-se completamente no princípio do líder. Ao centro de tudo encontrava-se a figura de Adolf Hitler e em termos de psicologia social ele representava o homem comum, de origem humilde, em posição de subordinação, ansioso para compensar seus sentimentos de inferioridade através da militância e do radicalismo político.
Na crise de 1929 o partido teve notável crescimento. Além de enorme penetração popular passou a ser encarado pela classe alta como representante de seus interesses econômicos. Na verdade, as mensagens nacionalistas e radicais cativavam pessoas de todas as classes sociais. Não apenas os seis milhões de desempregados alemães, que amargavam a crise mundial se encantaram com a pregação nacional-socialista, mas muitos intelectuais, pessoas do mais alto nível de escolaridade ficaram fascinadas por aquela ideologia. Tanto é que em 1926, na Universidade de Göttingen, que chegou a ser o maior centro de pesquisas matemáticas do mundo, mais da metade dos alunos era nazista.
Nas eleições de 1930, quando os nazistas conquistaram 107 cadeiras no parlamento alemão, a porcentagem de votos obtidos por Hitler na cidade de Göttingen foi o dobro da que ele obteve em média em toda Alemanha. Como a cidade girava em torno de sua universidade famosa onde, inclusive, Einstein se socorreu de um professor de matemática para desenvolver sua Teoria da Relatividade, pode-se dizer que o apoio a Hitler naquele local da Alemanha veio de uma elite intelectual.
O caminho para a ditadura foi conseguido quando o presidente von Hindenburg nomeou Hitler chanceler. Com a morte de Hindenburg, Hitler fundiu a chancelaria com a presidência e a partir daí acumulou poderes cada vez maiores: Extinguiu o Poder Legislativo através do cerceamento de suas prerrogativas; implementou o controle completo da burocracia estatal, ou seja, aparelhou o Estado; eliminou gradativamente os outros partidos fazendo com que qualquer tipo de oposição desaparecesse; assumiu o comando supremo das Forças Armadas e os militares prestaram juramento àquele que se concedera o título de Führer.
Assim, aos poucos, o Estado totalitário substitui o Estado burguês.
Enquanto isso Hitler ia se impondo de maneira incontestável, seduzindo a nação pela força de seu carisma aliada a intensa propaganda produzida pelos meios de comunicação de massa. Em empolgantes discursos o ditador acentuava a esperança, a auto-estima, as boas notícias e prometia ao povo alemão um futuro brilhante numa linguagem que podia ser compreendida até pelas pessoas mais simples. Sua aprovação ultrapassava os 80% e ele seguia levando a risca a idéia do seu grande inspirador, Mussolini, que dizia: “Em política, 97% do apoio popular vem da propaganda governamental e só 3% das realizações efetivas”.
Possíveis insatisfações e ódios eram canalizados para os judeus para desviar a atenção de problemas concretos. Desse modo o monstruoso Holocausto foi aceito com naturalidade, como purificação da raça superior ariana, com a vantagem de que a brutal eliminação dos judeus abria espaços para a classe média alemã nas atividades do comércio e da pequena indústria onde aqueles atuavam.
Muito útil foi também a utilização de símbolos e conceitos marxistas adaptados a ideologia nazista. O proletariado tornou-se “proletariado racial” e a luta de classes deslocou-se para a guerra proletária contra os países capitalistas.
É verdade que durante os seis anos de totalitarismo nazista a Alemanha experimentou grande crescimento, mas tal coisa teve pouco a ver com as políticas econômicas do Führer, mas sim com a recuperação econômica mundial depois da crise de 1929 e com o talento dos empresários alemães que já dispunham de modernas tecnologias.
Hitler dominou a totalidade da vida da sociedade alemã, ampliou os lucros dos grandes trustes econômicos e levou mundo à Segunda Guerra Mundial. O resto todos conhecem.
Seria impossível essa experiência se repetir de forma idêntica. Ela aconteceu a partir de certas circunstâncias de um dado país, numa determinada época e sob o influxo de uma personalidade carismática sui generis. Mas as sementes maléficas do nacional-socialismo, que floresceram no nazismo, não seriam passíveis de novas floradas trágicas, com outros nomes, em outras épocas e em outras sociedades? Será que o nacional-socialismo ressuscitou bem junto a nós através de uma versão tropicalista, adulterada, falsificada, longe anos-luz da envergadura carismática e maligna de Hitler, mas igualmente nociva? É prudente pensar nisso.
Maria Lúcia Victor Barbosa
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